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A Profissão do Psicólogo Clínico no Brasil Está Em Crise?

Atualizado: 29 de jul. de 2019

Por Silverio Karwowski*


Existem situações que estão lançando cada vez mais a prática da psicoterapia numa condição de crise. A solução para evitar esse tipo de situação encontra-se no desenvolvimento de características pessoais, suficientes para exercer a profissão de forma satisfatória. Nesse post vou citar as condições de crise e também as características necessárias para se lidar com a situação evitando assim a confirmação da crise.


A quantidade de psicólogos clínicos no mercado de trabalho tem aumentado substancialmente nos últimos anos. Isso se deve, em parte, ao crescimento das Instituições de Ensino Superior, ao aumento das faculdades de psicologia que acompanham esse crescimento, e à facilidade de acesso aos cursos superiores propiciado por sistema governamentais de financiamento. Essa situação propicia um crescimento considerável do número de psicólogos (segundo o CFP, atualmente são 333.596 psicólogas(as) em todo o Brasil, registrados no Sistema Conselhos). De outro lado, a identidade dos estudantes de psicologia continua sendo predominantemente com a clínica, provavelmente estimulados pelo fascínio que a área traz ao ser humano, ligado ainda à suposta proximidade da profissão com a área médica.


Outro aspecto que também torna duvidosa a prática em consultório privado como fonte razoável de rendimentos, suficiente para garantir o reconhecimento profissional: os planos de saúde.

Outro fator que contribui para o aumento de profissionais que se identificam e buscam a prática clínica como profissão, principalmente no que se refere a consultórios privados, é a facilidade de acesso ao início do exercício profissional: não existe, nem por parte do órgão de regulação da profissão de psicólogo, CFP, nem por parte do ministério do trabalho que regulamenta as profissões no Brasil, nenhum procedimento que selecione, reconheça a competência e autorize psicólogos formados a começarem suas carreiras como clínicos, baseados em critérios precisos e reconhecidos como por exemplo, características pessoais necessárias para a prática na clínica.


A quantidade de psicólogos no mercado aliada à facilidade de acesso à início do exercício profissional encontra ainda um outro aspecto que também torna duvidosa a prática em consultório privado como fonte razoável de rendimentos, suficiente para garantir o reconhecimento profissional: os planos de saúde.


Característica complexa de um sistema de saúde competitivo e privado, os planos de saúde se apresentam ao mesmo tempo, como solução para tratamento e prevenção de saúde (em um país que o sistema público é atacado como ineficiente e ineficaz); e também como grandes organizações que definem quais tratamentos podem ser acessados e quais procedimentos de saúde são efetivamente válidos, direcionando a formação dos psicólogos e suas opções.


Sendo a psicoterapia um tratamento considerado paramédico e não diretamente ligado à prática médica, os planos de saúde são obrigados pelo governo a oferecer o serviço aos conveniados, mas, no entanto, pagam um valor ínfimo por sessão e autorizam uma quantidade bastante limitada de sessões para cada segurado. Como consequência, abordagens associadas a práticas mais velozes são mais desejáveis que processos de longa duração, como muitas práticas de psicoterapia se delineiam.


Uma das características de nossa era é a grande quantidade de mudanças a que estamos sendo expostos ou testemunhas. A era da informação, tal como está sendo entendida a contemporaneidade, traz uma revolucionária forma de acesso à informação e também da sua produção. Mudam-se as formas de execução dos serviços, do ensino e de participação social. Como consequência imediata, começam a surgir práticas psicoterápicas online, alterando substancialmente também a forma de interatividade. Por ser recente, ainda não existem estudos que problematizem e validem os resultados dos trabalhos online, mas, pode-se afirmar que esses processos parecem ser definitivos, ou seja, vieram para ficar.

Some-se a isso que os costumes também mudaram. O casamento se ampliou e a concepção de família está passando por profundas transformações. Há quem resista, mas as mudanças se instalam mesmo a contragosto.


Tal situação e condições, parecem ser suficientes para o entendimento de que a profissão de psicoterapia está em crise, ou ainda, de que é impossível se realizar, devendo então o psicólogo procurar outras áreas de atuação. Mas vejamos.


Para não entrar em crise junto com todas essas impressões e condições passa pelo entendimento de que a prática da clínica como profissional liberal requererá cada vez mais, por parte desse profissional, a percepção de si mesmo como empreendedor e não apenas como clínico.

Se estamos tendo mudanças constantes e elas são inevitáveis, como se preparar profissionalmente para lidar com as diversas situações que estão acontecendo e que ainda acontecerão? Quais são as características necessárias para se lidar com essa instabilidade, com as incertezas em relação à clínica e com tantas mudanças ainda vindouras? Parecem ser tantas transformações que as pessoas não têm nenhuma segurança a respeito de terão ou não competência para atuar pessoal e profissionalmente.


Uma das condições para se entender a possibilidade de se viver da clínica, e não entrar em crise junto com todas essas impressões e condições passa pelo entendimento de que a prática da clínica como profissional liberal requererá cada vez mais, por parte desse profissional, a percepção de si mesmo como empreendedor e não apenas como clínico. A maioria dos clínicos, por fazer críticas importantes ao neoliberalismo e às atitudes nocivas que um capitalismo puro e simples traz, acabam por não aceitar que diante de um cenário altamente competitivo e instável é preciso se conhecer em profundidade a profissão e suas nuances, assim como as competências administrativas que são necessárias para o exercício da profissão.


Não se trata da competência técnica, ou seja, da habilidade do profissional na realização de psicodiagnóstico, plano de tratamento e intervenções específicas para atuação como psicoterapeuta. O desenvolvimento de competência técnica é indiscutível como necessário para a prática da psicoterapia, mas tem sido insuficiente para que o clínico estabeleça seu consultório e mantenha seus clientes de maneira a viver bem de sua profissão.


Outro modo de enfrentar e de se preparar para enfrentar essas condições aponta para o desenvolvimento de características adequadas para lidar com mudanças e instabilidade, e que sejam elas mesmas, relativamente permanentes diante do processo de mudança. Essas características, na verdade um grupo de competências chamadas de competências duráveis estão intimamente relacionadas com a profissão do psicoterapeuta.


Essas competências são elementos fundamentais para o sucesso de qualquer profissional, independente do contexto em que ele esteja inserido, e é nessas competências que o profissional que se preocupa em manter seu desempenho, a despeito das mudanças, deve investir. Vou lista-las aqui, e em um próximo post farei uma exposição de cada uma delas e sua relação com a psicoterapia. São elas: manutenção do foco (ou capacidade de concentração), criatividade, amplitude de pensamento (analítico, sintético e sistêmico), habilidade de se comunicar, capacidade de se relacionar e capacidade de realização.


O clínico experiente reconhecerá que essas competências estão relacionadas a condições de saúde, entendendo obviamente que saúde não se trata da ausência de doenças, mas sim com características que levem o ser humano a desenvolver-se e alcançar satisfação, de maneira mais plena possível.


*Silverio Karwowski é psicólogo e gestalterapeuta. Atualmente dirige o IGC - Instituto Gestalt do Ceará e coordena o Curso de Psicologia da Faculdade Ari de Sá.


 

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